O menino não gostava de comer carne. Criança em geral não gosta, tem preguiça de mastigar. As mães também não ajudam: amassam a comida para ficar mais fácil de mastigar, ensinam a molhar o pão no leite, picam as frutas. Depois da invenção do liquidificador, então… Se fôssemos roedores, nossos dentes sairiam da boca, tão pouco os usamos na infância.
“Eu não tenho fome.”
“Não tem quinze minutos, você me pediu bolo, dizendo que estava morrendo de fome.”
O menino fica sem resposta por um tempo. Não muito, a julgar pelo pouco que come, praticamente só arroz e feijão.
“Posso comer só o arroz e o feijão?”
“Não, mas se quiser pode comer só a carne e a salada.”
A salada ele também não quer.
“Mas eu não gosto de carne. Eu quero nuggets. Ou salsicha.”
“Não me interessam as porcarias que teus colegas comem. Você vai comer a carne… como pessoas normais comem.”
A mãe já dá sinais de que vai perder a paciência.
“Está duro.”
“Me deixa ver.”
A mãe corta um pedaço da carne do menino e ela mesma come.
“Não está, não. Pode comer.”
“Tem sangue.”
“Isso é molho.”
“Está crua.”
Está na hora de perder a paciência. Sabe lá o que é correr a manhã toda com as coisas para fazer e ainda ter que insistir para o fedelho comer?
“Está cozida, muito bem cozida. E você vai comer e me falar que esta uma delicia.”
O menino se assusta com o tom da voz dela. Ela também. Ele, falso, ameaça chorar.
“Mas está vermelha, parece viva.”
A mãe recupera a calma.
“Você vai comer essa carne de qualquer jeito. Não vou brigar com você. Mas você só sai daí depois de comer. Nem que chegue a hora do jantar e eu coloque o teu aí por cima do almoço no mesmo prato.”
O menino chocado olha a comida com medo até ter um lapso de engenhosidade. Vai apelar às suas gracinhas de criança que a mãe acha engraçadas, julga serem inocência. Isso sempre o livra das piores.
“Olha, mãe. Olha como esta crua ainda. Está viva.” — espeta a carne com o garfo — “Muuuuuuuuuuuu”.
“Mu? Essa carne é de porco.”