Em Branco

Quando se pega o costume, uma noite sem escrever não é apenas uma a mais. É uma a menos, parece que não foi vivida. Uma folha em branco.

Imagina passar dias, algumas semanas sem escrever. Se não aproveitar essas folhas depois, se as pular como folhas em branco de uma agenda, é como pular uma parte da vida. Dias sem registro. Dias em branco, folhas em branco.

E as folhas puladas, se a gente se acostuma, acabam virando folhas enormes, eternas, amarelam, amassam, estragam. O caruncho as come e não aceitam mais tinta. No caderno, dos dias vividos, essas folhas parecem de papel de seda, aquele dos pipas, grandes de chatas, finas, translúcidas. Mas já não servem mais para pipa. Pesadas, não tem como fazê-las voar.

Fossem lençol ao invés de papel, não me cobriria com ele ou sobre ele para passar a noite e dormir. Ao invés, vestiria-o, em pé, e vagaria como fantasma.

5 comentários em “Em Branco”

      1. Escrever acho que é o que permite a alma falar, aquele tipo de fala única… E eu adoro ler o que escreve… Imagino o cenário, os personagens que descreve, imagino a quem se direciona as falas, os sonhos….

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        1. Acho que você talvez tenha razão. São coisas que eu escrevo que há muito tempo deixei de falar. Escrever é como se fosse uma vida paralela o todo o resto que vivo. Talvez essa dicotomia seja explicada por não ser o eu do dia-a-dia escrevendo, talvez seja um eu meio abandonado no passado (a alma?). Eu também imagino, os cenários, as personagens, as falas, a quem se dirigem, como está o tempo, o dia, o que aconteceu antes, o que sentem e porque fazem. Às vezes imagino até demais do que caberia no papel ou no viver. Imagino tudo. Queria como louco viver só minha imaginação…

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